ECONOMIA: A CIÊNCIA DA DÚVIDA.

ECONOMIA: A CIÊNCIA DA DÚVIDA.

 

Sra. Presidente, Sras. e Srs. Deputados , senhoras telespectadoras e telespectadores da TV Alerj, senhor intérprete da linguagem de libras, que leva a nossa voz aos deficientes auditivos.

Ontem assisti, na integralidade, no programa Roda Viva, a entrevista do Presidente do Banco Central sobre duas polêmicas: se o Banco Central deveria ter independência e se a taxa Selic deveria estar no patamar de 13,75 pontos percentuais. E, para fazer análise dessas questões, é preciso voltarmos aos últimos vinte anos.

Em 1994, ainda no Governo Sarney, a inflação chegou a bater 30% ao mês. 30% ao mês! Saiu Sarney, entrou o Collor – eleito – e foi cassado, foi impichado. Assumiu o Itamar Franco. E, para enfrentar essa inflação totalmente fora de controle, 30% ao mês, ele, com alguns economistas que estudaram todas as hipóteses possíveis, implantaram uma unidade chamada URV, que era para fazer a transição do Cruzeiro para o Real, adaptando o poder de compra.

Depois do Itamar, entrou Fernando Henrique Cardoso e foi instituída a nova moeda, o Real.

Então, o Real foi implementado pelo FHC, mas foi criado no Governo Itamar.

E o Banco Central, que não era independente, estabeleceu uma Taxa Selic na ordem, salvo erro de memória, de quase 30%, mas era para enfrentar uma inflação que vinha de 30, um descrédito total da moeda e a moeda tinha mudado.

Foram-se oito anos do Governo FHC e, gradativamente, essa taxa de juros vem aumentando.

Mas houve um fenômeno internacional, à época, que abalou muito o câmbio no mundo, que foi a questão da Rússia e a questão lá no México, e novamente a inflação retomou, não com a mesma intensidade.

Saiu Fernando Henrique, assumiu Lula, pela primeira vez. Ele chamou para ser presidente do Banco Central um CEO de um banco americano, chamado Henrique Meirelles, que tinha sido eleito Deputado Federal por Goiás, salvo erro de memória, pelo PSDB, e foi catado a dedo, como um digno representante do sistema bancário mundial, leia-se “digno representante dos banqueiros internacionais”, para ir para o Banco Central. A Taxa Selic bateu mais de 21%. Mais de 21%. A ponto, e me lembro, em um debate do Lula contra o Alckmin, 2º turno, o Lula dizer assim para o Alckmin “olha, não sei por que esses banqueiros reclamam tanto de mim, porque ganharam rios de dinheiro no meu governo.” Mas colocou essa Taxa Selic lá em cima, porque era um momento conturbado, difícil ; havia , de fato, o prenúncio de uma crise fiscal. E, paulatinamente, nos seus dois governos sucessivos, essa taxa de juros foi diminuindo e continuou nesse diapasão, inclusive nos seis anos de Governo Dilma.

Mais tarde, no Governo Bolsonaro, criou-se o Banco Central independente.

Então, a questão central não é se o Banco Central é independente ou não, é a lógica da definição da Taxa Selic.

Por que a Taxa Selic tem que ser alta? Vislumbra-se sempre dois grandes motivos: vai perder controle da inflação ou uma crise fiscal se anuncia de grandes proporções; aí, preventivamente, aumenta-se a taxa de juros. Para quê? Para segurar o consumo, e com isso segurar a inflação.

Ora, então, o que tem que se discutir, primeiro, é essa lógica, porque essa lógica de corrigir qualquer espirro da economia aumentando a Taxa Selic é a lógica dos banqueiros, porque sempre que subir a taxa de juros os banqueiros vão ganhar, e vão ganhar os rentistas também. É “Vovó viu a uva”. E quem vai perder? Quem precisa de crédito no mercado é, também, a classe trabalhadora. Essas são as premissas.

Todos os governantes que passaram no Brasil, de 94 para cá, praticaram taxas de juros muitas vezes altas e, sempre que puderam, taxas de juros mais acessíveis.

Mas vamos chegar aos tempos atuais. Ouvi, ontem, muita demagogia. A primeira delas é dizer o seguinte: “Se a inflação ficar descontrolada, quem mais perde é a classe trabalhadora”. Claro! Se a inflação ficar sem controle, a classe assalariada, que não está investida em dólar ou em títulos da dívida pública, perde o poder de compra, exatamente no valor da inflação mensal. De outro lado, sempre que essa taxa de juros estiver acima do que deve, os banqueiros estarão se locupletando do bolso da população.

Nós temos risco momentâneo de a inflação disparar? Eu tenho ouvido muitos economistas, mas a economia não é uma ciência da certeza: é uma ciência da dúvida. Economia é assim: depois que acontece, se diz: “Eu havia previsto”. Mas a grande maioria das previsões também não ocorre. O que há de mais difícil no mundo é alguém fazer uma previsão e costurar essa previsão com o consumidor.

Essa premissa de disparar a inflação existe? No meu entendimento e no de muitos economistas, não. E o risco fiscal que o presidente do Banco Central tanto disse que existia? “Tem possibilidade de risco fiscal.” Demonstra? Não demonstra. Risco fiscal de onde? Por quê? “Não, tem o risco.” Ora!

Então, na verdade, a taxa Selic está servindo para agradar o mercado e não para agradar a população. E o mercado forma opinião, porque sempre que se aliviam as condições da Taxa Selic, o mercado vem e diz: “A inflação vai subir”. Outros economistas dizem: “O risco fiscal se avizinha porque o país X está em crise. O caminho é subir a taxa Selic”.

E o que é a taxa Selic? É a soma da inflação com o juro real. Se a taxa Selic, hoje, é 13.75, e a inflação está na ordem de 5.75, o Brasil está praticando juros reais de 8 pontos percentuais.

E eu fui verificar. Nós somos, hoje, o maior juro real da face da Terra. Somos campeões mundiais de juros reais. E será que somos o país de maior risco cambial? Possivelmente, não. Possivelmente, não.

Essa questão tem que ser vista e debatida em profundidade, porque a taxa de juros afeta a economia como um todo. E há economistas de peso que nunca foram sectários que estão discordando profundamente desse momento que estamos vivendo. É só a gente abrir o olho para ver.

E não adianta se rotular economista, petista. Não. São economistas que estão analisando a economia brasileira e a economia mundial, que também se formaram pelas universidades Berkeley da vida, que têm experiência no mercado internacional. Então, é essa ponderação que nós temos que fazer.

Para terminar, Sra. Presidente, juro alto nunca foi forma de fazer um país crescer, porque o pequeno investidor precisa de crédito, e se o juro fica escorchante não adianta ele pegar esse crédito, porque ele não poderá ter retorno do seu investimento. Então, essa é a questão central. E, se o país não gera mais emprego e não gera mais renda, ele não sai do buraco em que está metido.

Então, precisa equilíbrio, bom senso, para chegarmos ao caminho ideal e praticarmos taxas de juros que sejam equilibradas com o nosso País, com o momento que estamos vivendo.

E, além do mais, definitivamente, se adota aqui no Brasil o modelo americano, e lá tem o Federal Bank, que é o Banco Central deles, que é independente; mas o Banco Central Americano, que dita a política de juros, trabalha em comum acordo com o ministério da economia, com quem adota as políticas econômicas, as políticas creditícias e as políticas financeiras. Não pode ter o Banco Central dissociado das propostas governamentais. É independente no sentido de que ele não aceita uma ordem para definir a taxa Selic, mas é uma instituição de estado que trabalha com o governo para o desenvolvimento econômico e social do país.

Ora, então é essa questão que precisa ser entendida. O Banco Central não está aparteado da governabilidade, ele não é um ente em si mesmo; são pessoas que têm mandato, mas nesse mandato têm que trabalhar junto com o governo que for eleito, chame-se ele João, José ou Manoel. Tem que trabalhar junto a bem do país.

Queria deixar isso claro, Sra. Presidente, porque essa é uma discussão muito intensa e que afeta a vida de todos nós.

Muito obrigado.

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